“Quando eu nasci, as frases que hão-de salvar a humanidade já estavam todas escritas, só faltava uma coisa: salvar a humanidade”. A frase é de Almada Negreiros, artista modernista multidisciplinar português, reconhecido, sobretudo, nas artes plásticas e na escrita.
Ora, é hoje “moderno” falar-se de IA e a sensação que temos é a de que se trata de uma solução de tal forma disruptiva, que não haverá nada que não venha a ser feito por esta tecnologia. Permite que um computador crie conteúdo original, como texto, imagens, música ou até mesmo vídeos. Sendo a IA generativa capaz de criar algo novo e inesperado, novos génios como Almada Negreiros serão inviáveis no futuro ou mesmo já no presente. Será mesmo assim?
Não me considero um velho do Restelo e, em toda a minha vida profissional estive ligado à tecnologia. Permitam-me, sem desvalorizar, dizer que estamos a viver um deslumbre, quanto às potencialidades. O caminho, em minha opinião, é mais lento do que parece, quando aplicada a IA generativa a ERPs, área que desenvolvemos, está a fazer 40 anos.
Apesar das possibilidades incríveis oferecidas, a IA generativa situar-se-á a par de outras soluções tecnológicas, como ERP e cloud computing. A diferença reside na capacidade de geração de conteúdo a partir de uma massiva quantidade de dados. Será sempre complementar e, mesmo no médio-prazo, não canibalizará tecnologias atuais.
Vejo antes a IA generativa como uma ferramenta de apoio ao utilizador, ao gerar respostas interpretativas e não a substitui à análise humana. Acredito antes no conceito de human augmentation: potenciar as capacidades de análise humana.
Quando aplicada a ERPs e à gestão, vemo-la, já hoje, a fornecer indicadores, como KPIs ou informação para dashboards, agilizando a interpretação de quantidades massivas de dados e contextualizando informação de gestão, permitindo identificar mais rapidamente oportunidades ou necessidades estratégicas, auxiliando na tomada de decisão com informação em tempo real.
Considero assim o papel da IA, no contexto atual, dominado por big data, essencial na identificação de padrões em dados históricos, criando previsões e oferecendo recomendações relevantes para a otimização de operações, melhoraria da eficiência e identificação de oportunidades de crescimento.
Vemo-la também, já hoje, disseminada em chat bots, a responder a perguntas recorrentes e a fornecer informação simples, reduzindo o número de chamadas e e-mails (otimizando recursos), numa experiência alinhada com as preferências das novas gerações que estão a chegar ao mercado.
Podemos ainda falar na automação de processos repetitivos e sem valor acrescentado, como relatórios ou documentos recorrentes, permitindo focar os recursos das organizações em atividades de valor acrescentado.As possibilidades que a IA generativa abre são, de facto, muitas, como “as frases que hão-de salvar a humanidade” de Almada Negreiros. Contudo, continua ainda a faltar uma coisa: “salvar a humanidade”, como nos anos de 1900. No que se refere à IA continua a faltar um modelo que venha revolucionar por completo a gestão empresarial e os ERPs ou salvar a humanidade.
Fernando Amaral é Chairman no Sendys Group