A falta de planos substantivos para a governação, a ética e o desenvolvimento estratégico da IA é alarmante e insustentável, dadas as implicações sociais da tecnologia.
Alguns partidos, como o CHEGA e o IL, identificam o potencial económico da IA através da modernização dos serviços públicos e do aumento da competitividade nacional. No entanto, os riscos colocados por uma tecnologia de dupla utilização e em rápida evolução não podem ser ignorados. Entretanto, partidos como o PCP e o LIVRE enfatizam, com razão, a proteção dos direitos constitucionais relativos à privacidade dos dados, aos direitos dos trabalhadores e à dignidade humana num mundo cada vez mais digitalizado, a par do avanço da IA. Mas raramente são delineados mecanismos políticos concretos para implementar sistemas de IA éticos, imparciais, seguros e alinhados com os regulamentos europeus emergentes.
O manifesto do PS detalha de forma mais abrangente as propostas para alavancar a IA em áreas como os cuidados de saúde, o planeamento urbano, a deteção de fraudes fiscais e os serviços jurídicos – mas está ausente uma visão orientadora para a governação da IA ou iniciativas para monitorizar o seu impacto social. A AD aborda a utilização da IA para avaliações ambientais, diagnósticos médicos e transparência na governação, mas não define como supervisionar o desenvolvimento responsável ou mitigar a deslocação de funções humanas.
O facto é que a política de IA é, em grande medida, um ponto cego na visão dos partidos para o futuro de Portugal. Tecnologias tão potencialmente transformadoras como a IA não podem ser uma reflexão tardia ou de baixa prioridade, especialmente quando outros países investem ativamente em estratégias nacionais de IA. Chegou o momento de todos os partidos envolverem os cidadãos portugueses no debate sobre políticas, regulamentos e incentivos abrangentes para orientar o progresso local da IA de forma equitativa, enquanto as normas globais se coadunam.
Se for conscientemente implementada com políticas baseadas em provas que orientem os testes, a transparência, a responsabilidade e as normas do sector, a IA pode impulsionar um enorme progresso. Mas a tentativa reactiva de restringir aplicações prejudiciais após o facto revelar-se-á muito menos eficaz. Precisamos de roteiros interpartidários agora, não de políticas reactivas quando surgem desafios inevitáveis. Os cidadãos merecem conhecer o plano de cada partido para capitalizar as imensas vantagens da IA e para se protegerem contra as suas desvantagens existenciais em caso de utilização indevida. O nosso discurso político deve corresponder ao ritmo sem precedentes da transformação tecnológica que a IA permite.
Nota: Este texto foi elaborado com base na análise do conteúdo aos programas eleitorais do BE (Bloco de Esquerda), CHEGA, IL (Iniciativa Liberal), LIVRE, PCP (Partido Comunista Português), PS (Partidos Socialista) e AD (“Aliança Democrática” – PSD, CDS, PPM). Através da pesquisa da palavra-chave “Inteligência Artificial”. O BE não menciona essa palavra-chave no seu programa mais extenso.
Ricardo Abreu é Docente Universitário