Macron e Moedas – Uma visão para uma Europa Tecnológica

O Presidente francês, Emmanuel Macron, visitou esta quinta-feira a Fábrica de Unicórnios, em Lisboa, onde debateu com o Presidente da Câmara, Carlos Moedas, perante uma plateia de empresários, temas como os desafios da inteligência artificial, o impacto da tecnologia na democracia e a competitividade da União Europeia face aos Estados Unidos e à China.
28 de Fevereiro, 2025

A conversa, que estava inicialmente agendada para as 17h40, teve inicio às 19:15, culpa da chuva que caiu sobre a capital portuguesa. Durante o debate, ficou evidente que a Europa enfrenta um dilema semelhante ao descrito por Clayton M. Christensen no seu célebre livro O Dilema da Inovação: como manter a liderança tecnológica num cenário global em rápida transformação?”. Literatura que nos fez superar a espera.

Carlos Moedas destacou a evolução de Lisboa como centro de inovação e empreendedorismo, com referência ao desenvolvimento da Fábrica de Unicórnios e à sua conexão com outras capitais europeias como Paris e Berlim. Macron reforçou a ideia de que a Europa precisa de recuperar a sua capacidade de liderar tecnologicamente, apontando a necessidade de maior integração e coordenação entre os diferentes atores do setor.

Ambos os líderes concordaram que o verdadeiro desafio para a Europa é a escalabilidade. O continente tem produção académica de alto nível e talentos de classe mundial, mas tem sido ineficaz em transformar esse potencial em indústrias globais de sucesso. Macron destacou que a falta de capacidade de cálculo e de investimento em Data Centers são lacunas críticas, sugerindo um maior papel do setor público no financiamento de infraestruturas essenciais para a IA.

A Inteligência Artificial e a competição global

Macron foi particularmente incisivo ao falar sobre IA, destacando que a Europa forma alguns dos melhores cientistas e engenheiros nesta área, mas muitos acabam por migrar para Silicon Valley. O presidente francês sublinhou que a Europa precisa de um ecossistema que retenham esses talentos, proporcionando melhores condições salariais e oportunidades de desenvolvimento.

A estratégia europeia para IA, segundo Macron, deve focar-se em dois pilares:

  1. Infraestrutura – Desenvolvimento de Data Centers eficientes e energeticamente sustentáveis na Europa, reduzindo a dependência de infraestruturas americanas e chinesas.
  2. Preferência europeia – Utilizar soluções desenvolvidas na Europa para garantir que os modelos de IA sejam alinhados com os valores europeus.

A abordagem de Macron ressoa com a estratégia francesa de reforço de soberania tecnológica, exemplificada pelo crescimento da startup Mistral AI, que procura competir com os gigantes americanos da IA generativa.

Europa: Um mercado ou uma potência?

Uma das mensagens mais fortes de Macron foi a necessidade de a Europa deixar de ser apenas um mercado e tornar-se uma potência tecnológica. O presidente francês enfatizou que os EUA e a China protegem os seus mercados internos, enquanto a Europa continua a ser o único bloco que não impõe restrições significativas à entrada de soluções estrangeiras.

Carlos Moedas reforçou esta ideia ao mencionar que a Europa precisa de alterar a sua estrutura de financiamento da inovação. Nos EUA, 70% dos fundos de investimento vêm de mercados de capitais e apenas 30% dos bancos, enquanto na Europa acontece o oposto. Segundo Moedas, é essencial aumentar a capacidade de risco e simplificar o acesso ao capital para startups e empresas tecnológicas emergentes.

O desafio transatlântico

O contexto político global também foi abordado. Macron salientou que a Europa precisa de se preparar para um período de incerteza nos EUA, especialmente com o ressurgimento de barreiras comerciais e a imprevisibilidade das eleições americanas. A estratégia, segundo Macron, deve ser dupla: manter laços próximos com os EUA, mas simultaneamente reduzir dependências críticas, especialmente em tecnologia e defesa.

A conversa entre Macron e Moedas apresentou uma visão otimista, mas pragmática, sobre o futuro da Europa como líder tecnológico. A mensagem central foi clara: a Europa tem os talentos e os recursos, mas precisa de ambição, integração e maior capacidade de investimento para evitar tornar-se um mero consumidor de inovações desenvolvidas noutros continentes.

O Presidente da Câmara Municipal de Lisboa Moedas concedeu ao Presidente francês a chave da cidade, como símbolo não apenas a amizade entre Portugal e França, mas também a urgência de a Europa abrir as portas a um futuro mais inovador e competitivo. No entanto, a questão central permanece: serão os líderes europeus capazes de traduzir esta visão em ação concreta?

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