Falta de talento em tecnologia: o problema não é novo — a resposta é que tem de mudar

A escassez de profissionais qualificados em tecnologia já não é novidade — mas a forma como as empresas a enfrentam continua, na maioria dos casos, a ser ineficaz. O desafio já não é apenas encontrar talento. É perceber que a luta pelo talento é também uma luta contra o tempo, contra modelos de recrutamento ultrapassados e contra uma cultura empresarial que ainda vê a formação como custo e não como investimento.
11 de Abril, 2025

Em Portugal de acordo com o relatório Global Talent Shortage Survey 2025, 76% das empresas portuguesas enfrentam dificuldades em contratar profissionais com as competências certas. Destes 76%: 44% são em Tecnologias de Informação (TI) e Dados, e 29% são nas Engenharias.

Este não é um cenário exclusivo do mercado português, toda a Europa enfrenta as mesmas pressões estruturais, com nuances locais.

A maioria das empresas compete pelos mesmos perfis — profissionais com cinco ou mais anos de experiência e fluência em idiomas locais. E quase um terço ainda não toma qualquer medida para colmatar esta escassez. Resultado? Processos de contratação longos, departamentos estagnados e oportunidades perdidas.

É altura de mudar a abordagem. Como os gestores devem encarar o problema? Que soluções podem aplicar?

1. Aposta na formação: o retorno está em casa

A formação de colaboradores internos é o caminho mais sólido para criar talento alinhado com a cultura da empresa e os desafios específicos do negócio. No entanto, ainda é subutilizada — muitas empresas temem que, ao qualificar os seus quadros, estejam apenas a prepará-los para sair. É um erro estratégico.

A pergunta que os líderes devem fazer não é “e se investirmos na formação e o colaborador sair?”, mas sim “e se não investirmos — e ele ficar?”. A formação contínua não só melhora competências como aumenta a retenção, cria oportunidades de progressão e atrai talento jovem à procura de ambientes onde se valorize o crescimento.

Formar perfis juniores é mais acessível e realista do que recrutar profissionais experientes — e cria uma pipeline de talento sustentável.

2. Freelancers: expertise imediata, com transferência de conhecimento

A integração estratégica de freelancers não é apenas uma resposta tática à escassez — é uma alavanca de inovação. Especialistas externos trazem experiência em contextos diversos, podem acelerar projetos críticos e, mais importante, transferir conhecimento para equipas internas.

Quando bem gerido, este modelo reduz dependências e fortalece a capacidade da organização de reagir a novas exigências tecnológicas. Mas atenção: freelancers devem ser usados como catalisadores, não como substitutos permanentes de competências nucleares.

3. Outsourcing com critério: nem tudo deve sair de casa

O outsourcing continua a ser uma ferramenta válida, mas só quando aplicado com lógica e controlo. Delegar parte da operação de TI pode trazer rapidez na resposta ao mercado e reduzir custos iniciais. No entanto, quando mal definido, representa riscos reais: perda de visibilidade sobre processos, falhas de comunicação e impacto na qualidade do serviço.

A solução passa por uma estratégia de outsourcing segmentada: quais tarefas ou áreas são críticas e exigem gestão interna? Quais podem ser externalizadas com garantias de controlo e integração? O tempo de resposta, a complexidade dos projetos, a disponibilidade de talento interno e os custos são os critérios que devem guiar esta análise.

4. Mulheres em tech: o maior grupo de talento inexplorado

Em áreas como cibersegurança, menos de 7% dos profissionais em Portugal são mulheres. Aumentar este número é mais do que uma questão de igualdade — é uma decisão racional de negócio. Aumentar a diversidade alarga o leque de talento disponível e traz perspetivas diferentes para a resolução de problemas complexos.

Para isso, as empresas têm de trabalhar com escolas, universidades e organizações locais para tornar o setor mais acessível e atrativo para raparigas e mulheres jovens — e criar ambientes onde a inclusão é prática, não apenas retórica.

A escassez de talento em tecnologia não é um problema conjuntural. É estrutural, e vai agravar-se. Os líderes que continuarem à espera do candidato ideal, com o perfil certo, experiência e fluência perfeita, ficarão para trás.

A resposta está na combinação de formação interna, uso inteligente de freelancers, outsourcing seletivo e estratégias de diversidade reais. Talento não é um recurso a captar. É um ativo a desenvolver.

Não é preciso reinventar a roda. Mas é urgente mudar a forma como a fazemos girar.

Opinião