COP29: Entre o possível recuo de Trump e a ascensão da China e Índia

Baku, capital do Azerbaijão, recebe a COP29, num momento particularmente crítico para o combate ao aquecimento global. A eleição de Donald Trump, um cético declarado das alterações climáticas, para a presidência dos Estados Unidos pode representar um sério revés para os esforços globais, com implicações significativas na liderança e financiamento de iniciativas de sustentabilidade.
12 de Novembro, 2024

Os principais especialistas, apelidam este cimeira de “COP Financeira”, um ponto de inflexão para o financiamento climático. No entanto, a ausência de figuras influentes do setor privado lança dúvidas sobre o impacto do evento na viabilização do New Collective Quantified Goal (NCQG), que requer financiamento de 1 trilhão de dólares por ano até 2030 para auxiliar os países em desenvolvimento a adaptar-se e reduzir emissões. Esta meta ambiciosa, ainda muito distante de ser alcançada, coloca a COP29 numa posição frágil: sem o apoio dos grandes emissores e financiadores, o caminho para os objetivos climáticos globais torna-se ainda mais árduo.

Retrocesso nas políticas climáticas

A ascensão de Trump significa um provável retrocesso nas políticas ambientais dos EUA, o que pode ter consequências devastadoras. A sua administração ameaça aumentar a produção de combustíveis fósseis e, possivelmente, revogar partes da Inflation Reduction Act, legislação vital para o desenvolvimento de energias renováveis. Segundo estimativas da Carbon Brief, as políticas de Trump poderiam acrescentar até 4 mil milhões de toneladas de emissões de carbono até 2030, representando cerca de 10% do total global atual.

Este cenário ocorre num contexto em que o planeta já enfrenta um aumento previsto de 2,9 graus Celsius nas temperaturas globais até o final do século, muito acima do limite de 1,5 graus considerado seguro pelas Nações Unidas. Com a sua influência, os EUA podem transformar-se de um agente mitigador para um catalisador do aquecimento global, dificultando as negociações e ampliando o fosso entre as nações desenvolvidas e em desenvolvimento.

Resiliência da China e a expansão das energias renováveis no sul global

Apesar do contexto desfavorável nos Estados Unidos, a transição energética ganha força em outras regiões, com destaque para a China, que emerge como líder global na produção de energia limpa. A capacidade instalada de energia solar do país atingiu 163 gigawatts nos primeiros nove meses de 2024, superando a capacidade combinada de países como Alemanha, França, Espanha e Itália. No setor de veículos elétricos, mais de 50% das vendas chinesas nos últimos meses foram de carros elétricos ou híbridos, demonstrando o compromisso do país em reduzir as emissões de transporte.

A Índia, por sua vez, projeta quadruplicar sua capacidade de energias renováveis até 2030, impulsionada por uma combinação de políticas favoráveis e investimentos crescentes. Este ritmo acelerado de adoção de energias limpas reflete-se no conjunto do Sul Global. Países em desenvolvimento, com o apoio de produções em larga escala chinesas e custos em queda, têm adotado energias renováveis a um ritmo superior ao dos países ricos, segundo o Rocky Mountain Institute.

Financiamento e o desafio de mobilizar recursos

Embora o Sul Global esteja a avançar na transição energética, ainda existem grandes obstáculos financeiros. Economistas como Nicholas Stern e Vera Songwe argumentam que esses países podem encontrar até 1,4 trilhões de dólares anualmente para as suas transições ecológicas, mas esse montante depende fortemente do compromisso dos países ricos em fornecer a quantia prometida de um  trilhão de dólares por ano.

Para tal, instituições multilaterais como o Banco Mundial e os bancos de desenvolvimento multilateral (MDBs) devem desempenhar um papel crucial, disponibilizando empréstimos e capital sem comprometer as suas classificações de crédito. A agência Fitch estima que os 12 maiores MDB poderiam ampliar os seus empréstimos em cerca de 480 mil milhões de dólares sem comprometer as suas notas AAA. Contudo, essa mobilização depende de apoio político e financeiro dos principais emissores, um apoio que se enfraquece com o retorno de Trump.

O risco de Isolamento dos EUA

As hesitações dos Estados Unidos não impedem que outros países avancem. Enquanto os esforços globais se fragmentam, a influência climática está a deslocar-se para o Oriente e o Sul. A China e a Índia não apenas adotam energias renováveis em larga escala, mas também estão a definir as normas para uma transição energética global. Este dinamismo é vital para sustentar a esperança de alcançar as metas climáticas, especialmente num momento em que a contribuição dos EUA é cada vez mais incerta.

No entanto, as tentativas dos EUA e da União Europeia para ampliar a responsabilidade climática a países como China e Arábia Saudita têm-se mostrado infrutíferas. Pequim insiste em ser considerada uma nação em desenvolvimento e, portanto, isenta das obrigações de financiamento do NCQG.

A COP29 em Baku ilustra um paradoxo global: à medida que alguns países avançam com medidas robustas de combate à mudança climática, outros, como os EUA sob a liderança de Trump, recuam. Este cenário fragmentado e bifurcado levanta questões sérias sobre a capacidade do mundo de responder coletivamente à crise climática.

Enquanto a necessidade de ação é urgente, os esforços desiguais e os desafios de financiamento permanecem entraves significativos. A COP29 simboliza um momento de reflexão para a comunidade internacional: será que o mundo poderá superar as suas divisões e avançar para um futuro sustentável, ou será que as diferenças políticas e económicas continuarão a ameaçar o destino do planeta?

Com informação Reuters 

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