À medida que o relógio se aproxima de um novo ano, talvez pelo Natal desenrola-se um cenário familiar: Os consumidores fazem fila, de carteira na mão, prontos a substituir os seus smartphones e alguns até eletrodomésticos perfeitamente funcionais pelos modelos mais recentes. Este ritual, impulsionado por um marketing implacável e por uma cultura de consumismo incessante, diz muito sobre os valores e as prioridades da nossa sociedade. Mas a que custo? Numa altura em que atravessamos uma era cada vez mais marcada por crises ambientais e por um apelo à sustentabilidade, é altura de fazermos uma pausa e reavaliarmos a nossa relação com a tecnologia.
A atração pelo último gadget é inegável. As marcas de tecnologia, com as suas estratégias de marketing inteligentes, aproveitam o nosso desejo de ter o novo e o melhor. Este ciclo de atualização constante alimenta a economia, criando empregos e impulsionando a inovação. No entanto, este ganho económico a curto prazo esconde um problema a longo prazo: a criação de uma cultura do descartável. Esta necessidade incessante de atualização não só é insustentável como também aumenta o fosso entre os que têm e os que não têm. Perpetua um ciclo em que apenas uma fração da população pode comprar a tecnologia mais recente, deixando o resto a braços com tecnologia desatualizada ou sem qualquer tecnologia.
Depois, há o impacto ambiental, a indústria tecnológica é famosa pela sua pegada de carbono, desde os processos de fabrico até à eliminação de aparelhos antigos. Os resíduos eletrónicos são um dos fluxos de resíduos que mais crescem a nível mundial, com milhões de toneladas eliminadas todos os anos, muitas vezes de forma incorreta. Este facto não só conduz à degradação ambiental, como também representa riscos para a saúde das pessoas envolvidas na reciclagem informal de resíduos eletrónicos.
Então, qual é a alternativa? A solução não é evitar a tecnologia, mas sim adotar uma abordagem mais sustentável em relação a ela. A solução começa com o fato de as empresas conceberem produtos com um tempo de vida mais longo e mais fáceis de reparar. É encorajador que algumas empresas já estejam a dar passos nesta direção, mas é preciso fazer mais. Os consumidores também desempenham um papel crucial, optando por manter os aparelhos durante mais tempo, escolhendo artigos recondicionados ou em segunda mão e reciclando os aparelhos antigos de forma responsável, podemos, coletivamente, ter um impacto significativo.
Além disso, temos de mudar a nossa mentalidade, deixando de ver a tecnologia como um bem descartável e passando a vê-la como um recurso valioso. Esta mudança exige educação e sensibilização, tornando os consumidores conscientes dos impactos ambientais e sociais das suas escolhas.
Concluindo, ao estarmos na encruzilhada do avanço tecnológico e da responsabilidade ambiental, é imperativo encontrar um equilíbrio. Adotar a sustentabilidade na tecnologia não se trata apenas de fazer escolhas mais ecológicas, trata-se de redefinir os nossos valores e prioridades enquanto sociedade. Ao darmos as boas-vindas a 2024, vamos também dar as boas-vindas a uma nova era de consumismo consciente, em que cada escolha conta para um mundo mais verde e mais sustentável.
Ricardo Abreu é Docente Universitário