A disponibilização do ChatGPT no final do ano de 2022, utilizando inicialmente o GPT-3.5 e atualizado em março de 2023 com o GPT-4, revolucionou a utilização das tecnologias de informação, com a disponibilização de uma aplicação de IA (Generativa) capaz de “criar” conteúdo, e de ser utilizado de uma forma extraordinariamente poderosa em praticamente todas as áreas de atividade, e massificada pela utilização pública. Aliás, o ano de 2024, nesta área, ficou marcado pelo investimento que as organizações, públicas e privadas, realizaram em iniciativas para a utilização de aplicações de IA.
No entanto, isso não significou um abrandamento no desenvolvimento dos modelos de IA Generativa, como se comprova por exemplo com o modelo da OpenAI “o1” (lançado em versão completa em dezembro de 2024) que atingiu um QI (quociente de inteligência) de 120 no teste da Mensa. Refira-se que este resultado é superior ao atingido por 90% dos humanos.
Este modelo “o1” respondeu corretamente a 25 de 35 questões do teste Mensa. Adicionalmente, para testar se o modelo tinha memorizado as questões/respostas, foi utilizado um questionário offline com questões que nunca tinham sido disponibilizadas publicamente, e embora o resultado tenha sido inferior, mesmo assim o desempenho foi superior à maioria dos resultados de humanos, sugerindo que a evolução no QI destes modelos de IA Generativa é real e não está apenas relacionada com a qualidade do treino, indicando que estão a ser registadas evolução no raciocínio e inteligência, e não apenas na capacidade de “debitar” informação memorizada!
Obviamente que com este potencial disponível, representando oportunidades disruptivas na forma como as tarefas são realizadas, e na eficiência dos resultados, as organizações não ficaram indiferentes, lançando iniciativas e projetos para criação de aplicações de IA e IA Generativa, embora em muitos casos sem a necessária estrutura ao nível de objetivos, plano e capacidade, o que se “desculpa” pela rapidez com que tiveram de embarcar na jornada (também para se posicionarem na vanguarda da inovação tecnológica), fruto de ciclos de inovação cada vez mais rápidos. Basta recordar que o automóvel demorou 62 anos a atingir 50 milhões de utilizadores, o Facebook 3, e o ChatGPT atingiu 1 milhão de utilizadores em 5 dias, contando atualmente com mais de 300 milhões de utilizadores ativos semanalmente.
A utilização da IA Generativa na realização das tarefas é hoje incontornável, porque permite fazer melhor e mais rápido. E isto não significa de todo que as pessoas serão substituídas pelas “máquinas”. Significa que têm ao seu dispôr uma nova ferramenta, que deve ser utilizada de forma parcimoniosa. Isto quer dizer que é possível utilizar um assistente (ou co-piloto, terminologia que tem vindo a ser globalmente aceite), por exemplo, para criar de forma automática o resumo de uma reunião e preparar um email para partilha, mas, que terá que ser necessariamente validado antes de finalizado e partilhado.
Aliás a curadoria do conteúdo gerado de forma automática por aplicações de Inteligência Artificial não é uma opção, é uma obrigação! E os vários casos de uso que vão sendo conhecidos demonstram-no. Recordemo-nos do “caso da sentença” assinada por um juiz federal brasileiro realizada com recurso ao ChatGPT e que incluiu jurisprudência inexistente…
Na saúde aplicações de IA demonstraram já ser particularmente úteis no auxílio ao diagnóstico, à elaboração de relatórios de exames, e no apoio para que os médicos possam direcionar a sua atenção para o paciente que têm à sua frente, em vez de a dividirem com o computador. Tomando como exemplo os relatórios de exames, a automação da criação do conteúdo do relatório, que será validado pelo técnico antes de ser finalizado, libertará tempo do técnico para a realização de exames, e agilizará a disponibilização dos resultados!
Claro que a utilização de IA na área da saúde, bem como em outras especialmente sensíveis e críticas, levantam questões relacionadas com segurança, ética, privacidade, transparência, direitos dos cidadãos… E isto terá que ser resolvido através da regulação (opinião que não é unânime), no espaço Europeu através do AI Act aprovado pelo Parlamento Europeu em março de 2024, em complementariedade com o Regulamento Geral de Proteção de Dados!
Ainda sobre casos de uso, na Gestão de Projetos, tomando como exemplo projetos na área das Tecnologias de Informação, o Project Management Institute já divulgou casos de sucesso na criação de versões “draft” de entregáveis como o project charter e o cronograma na fase de iniciação do projeto, e de relatórios de progresso na fase de execução. Claro que surgirá sempre a questão da qualidade dos “rascunhos”…
Parte da resposta estará nas aplicações de IA utilizadas, e na qualidade da interação com as aplicações através das prompts. É muito diferente “pedir” ao ChatGPT para escrever a letra para uma canção, ou “pedir” para escrever uma canção romântica, inspirada num dia chuvoso! Por isto é tão relevante o “prompt engineering”.
Ainda na utilização, a área da educação tem suscitado uma alargada discussão, e a academia não está preparada de forma geral para a utilização de IA. No entanto os alunos utilizam-na. Resta saber se pretendemos que os alunos perguntem ao ChatGPT “Qual é a derivada de (f(x) = x^2 + 3x + 2)?” ou “Explica passo a passo o calculo da derivada de de (f(x) = x^2 + 3x + 2)”, conseguindo desta forma um reforço da aprendizagem em sala de aula.
Em resumo, a utilização de aplicações de IA e a evolução dos modelos é uma revolução que não é possível “parar com as mãos”, e cujos benefícios são evidentes e crescentes. Quem não “entrar no comboio” ficará obsoleto. Todos têm que se preparar para a sua utilização seguindo uma abordagem de adaptação à mudança em termos de conhecimento, competências, organização, processos, regulamentos, guias…
Hélder Quintela é Delivery Manager na NTT Data, e professor convidado do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave.